sábado, 18 de março de 2017

"Vidro Quebrado", Alain Mabanckou

Olá, queridos leitores!

Já faz um bom tempo que não passo por aqui, mas hoje tive uma folga e resolvi compartilhar com vocês a minha última leitura! Estou fazendo parte de um workshop sobre Literatura Africana na Universidade de Amsterdam, onde temos discutido assuntos interessantíssimos. Confesso que tenho muito pouco conhecimento sobre literatura africana e este curso tem sido uma ótima oportunidade para abranger meus horizontes literários.

Alain Mabanckou
O primeiro autor com quem trabalhamos foi Alain Mabanckou, nascido em 24 de fevereiro de 1966 na República do Congo. Mabanckou já escreveu onze livros, incluindo Azul, branco, vermelho (1998), E só Deus sabe como durmo (2001) e African Psycho (2003), além de livros de poesia, ensaios e antologias. Atualmente, Mabanckou trabalha como Professor Titular de literatura francófona na Universidade de Califórnia (UCLA).

O livro de Mabanckou que lemos foi Verre Cassé, cuja tradução literal seria Vidro Quebrado - porém o livro ainda não foi traduzido para o português brasileiro. Esta obra de Mabanckou me surpreendeu temática e formalmente. Em primeiro lugar, o que me chamou a atenção foi a escrita de Mabanckou, que segue em um fluxo contínuo, sem pontos, letras maiúsculas ou parágrafos, apenas vírgulas. Há uma certa semelhança com o estilo de José Saramago. O resultado é uma explosão de frases e impressões - que chega a deixar o leitor sem fôlego! -, ainda mais por ser escrito em primeira pessoa.

Quem nos conta a história é Verre Cassé, um homem nos seus sessenta anos, que recebeu um caderno do dono do bar que costuma ir, Credit Gone West, para escrever sobre as histórias e personagens que frequentam o bar. Hesitante no início, Verre Cassé decide aceitar o desafio e passa os seus últimos dias sentado à mesa do bar, observando tudo a sua volta e escrevendo.

As histórias que Verre Cassé conta são, ao mesmo tempo, divertidas e trágicas: as controvérsias com relação à inauguração do bar, o homem que foi acusado de abusar sexualmente sua própria filha e foi levado à prisão, o homem que foi trocado pelo seu próprio filho por sua nova esposa, a competição entre um homem e uma mulher para ver quem urinava por mais tempo e com mais força, entre outras histórias de diversos personagens que passaram por Credit Gone West.

Ao mesmo tempo que Mabanckou exalta a importância da memória - daí a importância de Verre Cassé escrever sobre os ordinários frequentadores do Credit Gone West e suas vidas ordinárias -, Mabanckou, através das suas centenas de intertextualidades e referências a outras obras literárias, critica os escritores africanos que acreditam que deveria existir uma literatura africana unificada, uma literatura que falasse apenas sobre os problemas que a África enfrenta. Mabanckou elabora o seu manifesto: "e aqueles que pensam que um homem Negro não deveria falar de bétulas, de pedras, do pó, do inverno, da neve, de uma rosa, ou simplesmente da beleza pela própria beleza" (traduzido livremente por mim). O autor negro, segundo Mabanckou, não deve se limitar a falar dos preconceitos que sofre, ou da sua condição sociopolítica. O autor negro deve ser livre para escrever sobre o que quiser!

Ler Vidro Quebrado foi uma experiência e tanto para mim. Fiquei curiosa para ler mais livros de Mabanckou (fiquei fascinada pelo seu estilo de escrita) e para ler mais livros escritos por autores africanos. Durante este workshop, ainda lerei Phaswane Mpe, Marie NDiaye, Ivan Vladislavic, entre outros. Portanto, logo retorno com mais posts sobre literatura africana para vocês.

Espero que tenham gostado de conhecer Alain Mabanckou!

Um ótimo final de semana a todos e, é claro, ótimas leituras!

Fernanda

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