terça-feira, 28 de novembro de 2017

"Aura", Carlos Fuentes

Olá, queridos leitores!

Carlos Fuentes
Hoje venho compartilhar uma leitura fantasmagórica de arrepiar. Trata-se da novela "Aura", escrita pelo mexicano Carlos Fuentes (1928-2012). Eu não conhecia esse autor e confesso que esse foi o meu primeiro contato com a literatura mexicana. Gostei muito do estilo de escrita do autor e já me animei a ler mais da sua obra. Ele nasceu, na verdade, na Cidade do Panamá, mas se mudou para o México aos 16 anos. Seus pais eram diplomatas mexicanos e, por isso, passou sua infância morando em diversas metrópoles mundiais - chegou até a morar no Rio de Janeiro. Na idade adulta, seguiu os passos dos pais e entrou para a diplomacia, trabalhando como embaixador do México na França por diversos anos. Também trabalhou como professor em renomadas universidades norte-americanas, incluindo Harvard, e recebeu diversos prêmios literários ao longo da sua carreira.

Com um currículo e tanto, não podemos deixar de ler Fuentes, não é mesmo?

"Aura" é uma das principais obras literárias de Fuentes, publicada em 1962. A primeira característica que chamou a minha atenção foi que o texto é escrito na segunda pessoa do singular, o que é uma prática um tanto quanto incomum. Ele inicia o texto da seguinte forma:

"Você lê esse anúncio: uma oferta assim não é feita todos os dias. Lê e relê o anúncio. Parece dirigido a você, a ninguém mais."

O narrador se dirige, portanto, diretamente a você, que se torna o protagonista da história. Você se torna Felipe Montero, vê o que ele vê, pensa o que ele pensa, sente o que ele sente. É uma experiência literária muito interessante.

Felipe é um jovem historiador que se sente intrigado com esse anúncio de trabalho no jornal, que parece ser direcionado a ele. Só faltava que lhe pusessem o nome. Precisando de um emprego, ele decide ir até o local descrito no anúncio para descobrir mais sobre esse posto. Ele chega em um casarão que parece abandonado, no meio do centro da cidade, rodeado por prédios modernos e comerciais que parecem engolir a velha casa.

Ele entra no casarão, que está totalmente escuro do lado de dentro. As luzes estão todas apagadas e há um cheiro de mofo e podridão no ar. Uma atmosfera um tanto fantasmagórica, que já induz o leitor a pensar que algo não está certo com relação a esse local.

Uma voz o chama de dentro da casa, e ele segue até um quarto, onde uma velha senhora se encontra deitada em uma cama. É ela quem o chamava. A cama em que ela deita está cheia de migalhas de comida e a velha está deitada, parecendo muito frágil, junto com um coelho. A cena fica cada vez mais esquisita.

A velha, chamada Dona Consuelo, lhe conta porque precisa dos seus serviços. Ela é viúva e gostaria que Felipe organizasse as memórias do seu falecido marido, o general Llorente, para publicá-los. Ela lhe entrega as pastas com os antigos documentos e avisa que Felipe deve morar na casa para terminar o trabalho o quanto antes. Felipe se sente indeciso ao olhar ao seu redor, mas sua indecisão se dissipa quando ele percebe que há outra pessoa no quarto. Aparentemente, ela estava ali o tempo todo. Era Aura, sobrinha de Dona Consuelo, que cuida da sua saúde. Ela é morena de olhos verdes e Felipe se sente atraído por ela instantaneamente e decide aceitar a proposta.


Conforme Felipe vai descobrindo mais sobre Dona Consuelo, Aura e o general através das memórias do falecido, o jovem vai ficando cada vez mais intrigado. Há uma atmosfera sombria nessa casa escura e na maneira como as duas mulheres se comportam. Durante um jantar, ele percebe que uma parece copiar os movimentos da outra, como se uma fosse o reflexo em um espelho da outra.

Mas Felipe não consegue deixar a casa, já se sente preso a Aura, que de um dia para o outro parece ter envelhecido vinte anos.

Como a história termina, eu não vou contar para vocês! Vale a pena ler esse livrinho curto de Fuentes e descobrir por si próprio. Aliás, há muitas interpretações possíveis. Gostaria muito de saber a sua opinião depois dessa leitura.

Eu estou curiosíssima para ler mais textos de Fuentes. Se você já leu algo do autor, deixe suas sugestões aqui nos comentários!

Uma ótima semana a todos e ótimas leituras!

Fernanda


quinta-feira, 9 de novembro de 2017

"O Estranho que Nós Amamos", Thomas Cullinan

Boa noite, queridos leitores!

Hoje venho compartilhar com vocês a minha mais recente leitura. E, devo adicionar, uma leitura muito envolvente, devorei as páginas! Trata-se de O Estranho que Nós Amamos, ou The Beguiled no idiomas original, escrito pelo norte-americano Thomas Cullinan (1919-1995) e publicado pela primeira vez em 1966.

Esse romance recebeu atenção renovada nesse último ano porque foi adaptado para o cinema sob direção de Sofia Coppola, e com Nicole Kidman e Kirsten Dunst no elenco. A versão do livro que chegou até mim foi a que traz na capa uma imagem do filme, que encontrei em uma caixa de promoções em uma livraria. Me interessei pela capa, pela ideia da adaptação cinematográfica, pela cineasta e atrizes envolvidas e, é claro, pela trama da história. Portanto, decidi levá-lo. E ainda bem que fiz essa escolha, pois esse livro se tornou um dos meus preferidos de 2017 com toda a certeza!

Antes de conversarmos sobre a trama, precisamos explorar um pouquinho do contexto histórico da época em que o livro se passa, pois ele é essencial para o desenrolar do romance. Estamos nos Estados Unidos na década de 1860 em plena Guerra de Secessão, ou Guerra Civil Americana, como também é conhecida, que durou de 1861 a 1865. Esse conflito se desenrolou entre os estados do Norte, conhecidos como a União, e os estados do Sul, ou Confederados. O Sul era escravocrata, enquanto o Norte era abolicionista, e essa foi a principal razão do conflito armado.



O Estranho que Nós Amamos se passa durante esse período em uma escola para meninas em Virginia, território dos Confederados, administrada pelas irmãs Martha e Harriet Farnsworth. Como se trata de um período de guerra, a comida se tornou escassa e muitas das alunas voltaram para as suas casas, com exceção de cinco garotas que permaneceram - ou por não terem para onde ir, ou porque suas casas foram ocupadas pelo exército Yankee, os nortenhos. As cinco garotas são extremamente diferentes umas das outras: Emily Stevenson é filha de um general de alto escalão do exército confederado e segue todas as regras. Alicia Simms é a segunda mais velha, tem 16 anos, e foi deixada na escola por sua mãe, uma mulher de reputação duvidosa e que não pagava as contas escolares. Edwina Morrow é a mais velha das garotas e a mais problemática. Ela trouxe roupas bonitas, itens de luxo - como sabonetes perfumados - e dinheiro para a escola. Houve rumores de que seu pai a abandonou na instituição porque ela era uma filha ilegítima de mãe negra. Amelia Dabney é a mais selvagem de todas, a segunda mais nova, gosta de passar o maior tempo possível na floresta, caçando animais e insetos para cuidar deles. E, por fim, Marie Deveraux, a única católica entre as alunas, é a mais nova de todas, tem apenas 10 anos, mas é muito inteligente e gosta de espionar os outros.


Mapa dos Estados Unidos durante a Guerra de Secessão

As duas mulheres que comandam a escola são irmãs que, ao perderem o pai e o irmão, herdam a propriedade no sul dos Estados Unidos. Porém, sem dinheiro para manter a mansão, elas decidem transformá-la em uma escola para meninas. Quem as auxilia é Mattie, a única escrava que permaneceu na casa. Os outros foram todos vendidos para cortar as despesas.

As meninas com Miss Martha e Miss Harriet no filme de Coppola

Em uma manhã durante o ano escolar, Amelia encontra algo surpreende ao caminhar pela floresta como de costume: um soldado Yankee ferido. A princípio, ela não sabe como agir, pois ele é do exército inimigo. Porém, ao perceber que ele estava muito ferido e semi-inconsciente, ela decide arrastá-lo para a escola. Há muita discussão e excitação entre as ocupantes da mansão, pois há muito tempo não havia um homem entre elas. Por fim, Miss Martha, a líder das irmãs, consente em deixá-lo ali até que ele se recupere. Ela usa de seus conhecimentos de enfermeira e cuida dos ferimentos do soldado, que aos poucos se recupera.

Colin Farrell como Johnny McBurney no filme de Coppola

O que era para ser um curto período do soldado Johnny McBurney na escola das irmãs Farnsworth acaba se tornando semanas e meses. A presença de Johnny na casa atrapalha a rotina de estudos da instituição e distrai as meninas, que, uma a uma, são seduzidas pelo charme desse estranho. No filme de Coppola, quem interpreta o soldado Johnny é Colin Farrell.

O soldado Johnny seduzindo uma das garotas
Miss Martha percebe a influência do rapaz nas meninas, mas mandá-lo embora se torna cada vez mais difícil, pois Johnny sabe de segredos que as garotas e mulheres na casa prefeririam não revelar. Juntas, elas terão que descobrir uma maneira de se livrar dessa constante presença.

O que eu mais gostei no livro de Cullinan foi que a história é contada através da perspectiva de todas as mulheres da trama. Cada seção traz o nome de uma das oito mulheres, e nesse trecho a perspectiva em primeira pessoa é da mulher ou garota que a nomeia. Dessa forma, podemos conhecer melhor a personalidade de cada uma através da maneira como ela escreve, e podemos saber seus mais íntimos pensamentos e segredos. É uma escrita muito envolvente, principalmente devido a essa presença sedutora e, ao mesmo tempo, assustadora.

Thomas Cullinan

Thomas Cullinan não é um nome muito conhecido da literatura mundial. Ele escreveu romances e peças teatrais. O Estranho que Nós Amamos é o seu livro mais famoso, que já foi adaptado ao cinema também em 1971, com Clint Eastwood no papel do sedutor soldado.Além desse romance, Cullinan publicou The Besieged (1970), O Oitavo Sacramento (1977) e The Bedeviled (1978). Eu fiquei curiosa para ler mais trabalhos desse autor!

Ainda não tive a oportunidade de assistir ao filme da Sofia Coppola - que, aliás, eliminou o papel da Mattie!. Por enquanto, vou deixar o trailer aqui para vocês conferirem:




Uma ótima semana a todos e, é claro, ótimas leituras!

Fernanda