domingo, 30 de agosto de 2020

"The Underground Railroad: Os Caminhos para a Liberdade", Colson Whitehead

 Olá, pessoal!

Recentemente eu decidi iniciar algo que sempre quis fazer: criar um clube de leitura! Eu já participei de alguns book clubs, mas sempre tive a vontade de organizar um grupo que se interessasse por livros e por discutir leituras de maneira informal. Por isso, reuni alguns amigos e cada um sugeriu um livro que gostaria que fosse nossa primeira leitura do clube. A partir dessas opções, fizemos uma votação. E o livro mais votado foi The Underground Railroad, ou Os Caminhos para a Liberdade, como foi traduzido para o português, escrito pelo norte-americano Colson Whitehead.

Esse livro recebeu o Prêmio Pulitzer de Ficção em 2017, um ano após a primeira publicação nos Estados Unidos. Além de ser um livro reconhecido pela crítica, ele foi (e continua sendo) bastante discutido, principalmente por tratar de um lado sombrio da história americana: a escravidão. A narrativa se passa nas primeiras décadas do século XIX, período, portanto, pré-Guerra Civil, e se inicia em Georgia, um estado escravocrata no sul dos Estados Unidos. No mapa abaixo, você pode conferir como a divisão do território americano se modificou ao longo dos anos desde 1789 até 1861, ano de início da Guerra Civil, também conhecida como Guerra da Secessão, que dividiu os Estados Unidos em União, no Norte, que condenava a escravidão, e os Estados Confederados no Sul, que mantinham a escravidão legalizada.




Georgia, portanto, era um estado onde a escravidão era permitida e, de fato, a base da economia agrária. Diversas plantações de algodão, milho e arroz eram movidas pelo trabalho dos escravos, a princípio trazidos do continente africano, e, mais tarde, já nascidos em solo americano. 

A protagonista de The Underground Railroad é Cora, uma jovem mulher negra, neta de Ajarry, uma mulher que havia sido capturada na África e trazida para os Estados Unidos para trabalho forçado. A mãe de Cora, Mabel, foi a única escrava até o momento que havia conseguido fugir da plantação dos Randall sem ter sido resgatada pelo temido caçador de escravos Ridgeway. A história é contada pela maior parte através da perspectiva de Cora, o que subverte as narrativas históricas conservadoras, que levam apenas a visão do conquistador branco em consideração. Em The Underground Rairoad, o leitor adentra essa sub-cultura das plantações escravocratas do sul norte-americano do início do século XIX, sofrendo com a protagonista as atrocidades que o branco inflingia nos africanos e seus decendentes, até mesmo nos escravos que haviam comprado a sua liberdade.

O livro é dividido em 12 partes (Ajarray, Georgia, Ridgeway, Carolina do Sul, Stevens, Carolina do Norte, Ethel, Tennessee, Caesar, Indiana, Mabel e O Norte), que são intitulados a partir do nome de algum personagem ou local que marcam a trajetória de Cora desde a plantação dos Randall em Geórgia em direção à liberdade dos estados do norte. Além disso, a maioria dessas divisões se inicia com a transcrição de um anúncio de jornal sobre a fuga de um negro ou negra e a recompensa para a sua captura ou informações do seu paradeiro. Esses anúncios são reais e retirados da coleção digital da Universidade da Carolina do Norte, e ilustram a maneira como esses seres humanos eram tratados como animais ou objetos.


Trajetória de Cora


A premissa desse livro é baseada na "underground railroad", ou "ferrovia subterrânea" na tradução literal, que foi de fato uma estrutura clandestina de rotas para auxiliar negros a escaparem da escravidão e alcançar os estados do norte ou Canadá, ativa até a segunda metade do século XIX. Essas rotas e casas de abrigo eram supervisionadas por abolicionistas e simpatizantes da emancipação dos escravos. Na verdade, apesar de ser chamada de ferrovia, estas rotas não eram, de fato, linhas de trem (linhas de trem subterrâneas só foram instaladas nos Estados Unidos em 1863). O nome foi utilizado de forma metafórica já que as pessoas que se aventuravam por essas rotas secretas desapareciam, como se tivessem sido engolidas pela terra, e também por causa da terminologia utilizada entre os envolvidos: estações, condutores, agentes, cargo, passageiros, etc. Os escravos que conseguiam atravessar essa jornada com sucesso mudavam de nome e deixavam sua identidade como escravos para trás para viver uma nova vida no norte. 



No livro The Underground Railroad, o autor Colson Whitehead re-imagina esse projeto clandestino para libertar escravos afro-americanos como uma ferrovia subterrânea literalmente. Cora é convencida por Caesar, outro escravo da plantação Randall, a fugir pela "underground railroad". Caesar quer a presença de Cora por boa sorte, já que a mãe dela Mabel foi a única a conseguir fugir daquele inferno. A sua mãe é uma figura bastante paradoxical para Cora, pois ela representa esperança pelo fato de que ela alcançara a liberdade, mas também lhe causa raiva e rancor por Cora ter sido abandonada por sua própria mãe e deixada para sofrer as consequências da escravidão.


"Resurrection of Henry Box Brown" Engraving by John Osler, published in William Still, The Underground Railroad (Philadelphia, 1872)

Essa é uma história bem pesada, em certos momentos eu tive que colocar o livro de lado para digerir a narrativa e pensar sobre a crueldade do ser humano, que podia inflingir tanto sofrimento - físico e mental - a outro ser humano. Na verdade, os donos de plantações, caçadores de escravos e apoiadores da escravidão não consideravam o negro como um ser humano, mas como uma criatura, desprovido de inteligência, sentimentos ou sonhos. É difícil de aceitar a crueldade do ser humano, mas essa foi a base da criação dos Estados Unidos, assim como de tantos outros países colonizados e escravizados, como o nosso Brasil. O processo para reverter esse pensamento e para que todos acreditem e respeitem a igualdade ganhou força com os membros da "underground railroad". Porém, esse é um processo que ainda não terminou. Duzentos anos depois, ainda estamos aqui, lutando pela igualdade.


Colson Whitehead

A "underground railroad" se tornou um símbolo de luta pela liberdade nos Estados Unidos e por isso o livro de Whitehead é tão importante: ele nos lembra desse lado sombrio da história americana, nos faz sentir enjoados pela crueldade com que os escravos eram tratados e castigados, mas também nos lembra da importância da resistência e da liberdade.

Espero que tenham gostado de saber mais sobre esse grande livro da literatura norte-americana contemporânea. 


Um ótimo final de semana e, é claro, ótimas leituras!

Fernanda

quarta-feira, 5 de agosto de 2020

"O Hobbit", J. R. R. Tolkien

Olá, pessoal!

Hoje eu venho compartilhar com vocês a minha mais recente leitura, que, aliás, é um livro que já estava em minha lista há realmente muito tempo. Eu li O Senhor dos Anéis quando eu ainda estava no colégio, e simplesmente me apaixonei pelo universo e estilo de escrita de J. R. R. Tolkien. Também me apaixonei pelos filmes de Peter Jackson, que me levaram a sonhar em ser diretora de cinema. Esse sonho não se concretizou, mas minha paixão pela atmosfera mágica da Terra Média não diminuiu. Os filmes da saga O Hobbit foram lançados entre 2012 e 2014 (nem acredito que já faz 8 anos da estreia do primeiro filme!) e renovaram o meu interesse no trabalho de Tolkien. Na época comprei uma belíssima edição de The Hobbit no original em inglês. São dois livros, Part 1 e Part 2, em um box de capa dura. Agora o porquê de eu ter esperado até julho de 2020 para iniciar essa leitura, eu realmente não sei explicar! Porém, esse dia finalmente chegou e a experiência foi fantástica!


The Hobbit, or There and Back Again foi o primeiro livro de Tolkien, publicado em 1937 (ele já havia publicado poemas anteriormente), e foi classificado como literatura infanto-juvenil. O livro foi muito bem-recebido pela crítica e pelo público leitor. Ele foi indicado à Medalha Carnegie, um importante prêmio literário para livros escritos para crianças e jovens, e recebeu o prêmio de melhor ficção juvenil pelo New York Herald Tribune. Até hoje, o livro já vendeu mais de 190 milhões de cópias.  

O livro se inicia com uma das frases mais conhecidas da literatura mundial (e uma das minhas preferidas!):


In a hole in the ground there lived a hobbit.

(Em um buraco no chão vivia um hobbit.)


O hobbit em questão é Bilbo Baggins, primo de Frodo Baggins, para quem é familiarizado com O Senhor dos Anéis. O buraco no qual Bilbo vivia, contudo, não era um buraco qualquer. Era um lar de um hobbit, e isso significa conforto: uma casa organizada, acolhedora, com muita comida e água quente sempre de prontidão na chaleira para um gostoso chá. Bilbo leva uma vida pacata e sozinha no Condado até receber uma visita inesperada. Por curiosidade, "Uma Festa Inesperada" é o primeiro capítulo de O Hobbit, que contrasta com o primeiro capítulo de O Senhor dos Anéis, intitulado "Uma Festa Muito Esperada". Essa visita inesperada consiste em um grupo de treze anões juntamente do mago Gandalf, que o convencem a participar de uma aventura. O objetivo: recuperar o tesouro que pertence à llinhagem de Thorin, filho de Thráin e neto do grande Rei Thór. A complicação? O tesouro está nas profundezas da Montanha Solitária, que fica do outro lado da perigosa floresta Mirkwood e guardada pelo dragão Smaug.



Para seguir nessa empreitada, Bilbo tem que deixar para trás os confortos do seu lar no Condado, mas ele terá como reconpensa uma viagem inesquecível - apesar de extremamente difícil e fatigante: eles encontram trolls, elfos, aranhas gigantescas, goblins, entre outros seres mágicos. Porém, como o próprio Gandalf diz, Bilbo nunca mais seria o mesmo. 

A continuação dessa saga prossegue com Frodo, primo mais jovem e herdeiro de Bilbo, na sua jornada ainda mais perigosa para destruir o anel. A trilogia O Senhor dos Anéis foi publicada entre 1954 e 1955, e traz uma atmosfera mais sombria e séria do que o divertido The Hobbit, porém tão fascinante quanto. Agora que retornei ao universo de Tolkien, quero ler mais obras do professor de Oxford. Graças ao trabalho de editor de seu filho, Christopher Tolkien, que infelizmente morreu em janeiro desse ano, mais textos de Tolkien estão disponíveis para o nosso prazer como leitores.


Espero que tenham gostado de saber mais sobre a minha experiência lendo O Hobbit.


Uma ótima semana a todos e, é claro, ótimas leituras!

Fernanda