sexta-feira, 17 de junho de 2016

"O Cortiço", Aluísio Azevedo

Olá, pessoal!

Eu venho aqui (com um terrível atraso!) compartilhar a minha experiência lendo O Cortiço, de Aluísio Azevedo. Esta leitura fez parte do desafio literário de abril, que era ler um livro nacional. Este livro já estava na minha lista de leituras há muuuito tempo! Desde o período de faculdade, quando um grupo apresentou um trabalho sobre este livro e me instigou! Pois fim, eis que o desafio literário de abril me fez cumprir a minha promessa pessoal de ler este livro.

O Cortiço foi escrito por Aluísio Azevedo e publicado pela primeira vez em 1890. Influenciado pelos franceses Émile Zola e Gustave Flaubert, Azevedo trouxe para o Brasil uma vertente do realismo chamada de naturalismo. Inspirados pelos novos conhecimentos científicos de fins do século XIX, os romances naturalistas partiam do pressuposto de que o homem é definido pelo meio em que vive. Ademais, os romances naturalistas esbanjavam linguagem coloquial falada - bastante inovador para a época -, e tratavam de temas como sexo, sordidez humana, violência, loucura, etc.

O Cortiço é um retrato da área menos favorecida no Rio de Janeiro de fins de século XIX. Os personagens que habitam o cortiço do João Romão, português que vivia com uma mulata brasileira, personificam diversos desses temas, como a mulata sensual Rita Baiana, o agressivo Firmo, a prostituta Léonie, a recatada Pombinha que mais tarde se entrega à prostituição, as lavadeiras, o português trabalhador Jerônimo que se deixa seduzir por Rita e acaba em perdição, sua mulher Piedade que se entrega ao alcoolismo após ser abandonada... enfim, uma grande miríade de personagens!

Personagens de O Cortiço

Ao mesmo tempo que estes personagens moram no cortiço, há um contraponto destes com os moradores do sobrado de Miranda, erguido junto à parede do cortiço. Miranda é um português que veio fazer fortuna no Brasil com sua esposa infiel Dona Estela e sua filha Zulmira. Ele recebe o título de barão e faz inveja ao seu vizinho, João Romão, que, apesar de rico, não participa da alta sociedade e nem recebe títulos nobres como Miranda. Cresce, então, uma disputa entre os dois portugueses.

Conforme os personagens vão se inter-relacionando, a trama vai ficando mais interessante e sórdida. Jerônimo se apaixona por Rita, deixando Firmo enciumado e abandonando sua mulher Piedade. Firmo, como vingança, agride Jerônimo. Pombinha se casa com o seu pretendente, mas percebe que prefere a vida de prostituta rica da sua protetora Léonie. João Romão pretende se casar com a filha do Miranda, Zulmira, para se apossar da fortuna de Miranda, mas, para isso, deve se livrar de Bertoleza, a mulata ex-escrava com quem viveu muitos anos.




Aos poucos, percebemos que os personagens perdem sua individualidade e se tornam um todo. Juntos, eles formam o cortiço, que poderíamos dizer ser o personagem principal desta trama, que dá título ao livro.


Confesso que ao iniciar a leitura, me senti um pouco desapontada, pois esperava mais de O Cortiço. No entanto, o leitor precisa de um tempo para se acostumar aos tantos nomes dos moradores e suas características, seus desejos e medos, para que, enfim, se possa tirar maior proveito da leitura. Assim que me vi envolvida com as tramas e sub-tramas deste intricado universo, me prendi de tal modo aos personagens que gostaria de saber como continuaram as vidas de cada um após a última página.

Um ponto muito positivo da escrita de Azevedo, mas que pode gerar certo estranhamento e desconforto proposital ao leitor, é a maneira como ele descreve lugares e pessoas sem rebuscamento ou idealizações, mas de forma nua e crua. As comparações e metáforas utilizadas por Azevedo são simplesmente sensacionais. Escolhi aqui um trecho como forma de ilustração. Neste momento do romance, Piedade - sem dinheiro e sem a ajuda do marido que a desertou - se mudou com a filha para o cortiço vizinho, chamado "Cabeça-de-Gato":

"E a mísera, sem chorar, foi refugiar-se, junto com a filha, no 'Cabeça-de-Gato' que, à proporção que o São Romão se engrandecia, mais e mais ia-se rebaixando acanalhado, fazendo-se cada vez mais torpe, mais abjeto, mais cortiço, vivendo satisfeito do lixo e da salsugem que o outro rejeitava, como se todo o seu ideal fosse conservar inalterável, para sempre, o verdadeiro tipo da estalagem fluminense, a legítima, a legendária; aquela em que há um samba e um rolo por noite; aquela em que se matam homens sem a polícia descobrir os assassinos; viveiro de larvas sensuais em que irmãos dormem misturados com as irmãs na mesma lama; paraíso de vermes; brejo de lodo quente e fumegante, de onde brota a vida brutalmente, como de uma podridão" (p. 217)




É preciso dizer mais?

Aluísio Azevedo
Aluísio Azevedo nasceu em São Luís, Maranhão, em 14 de abril de 1857, e morreu na Argentina em 21 de janeiro de 1913, aos 55 anos. Além de escritor, Azevedo trabalhou como jornalista, desenhista, pintor, caricaturista e diplomata. Em 1876, ele mudou-se para o Rio, onde estudou na Academia Imperial de Belas-Artes. Seu primeiro livro publicado foi Uma Lágrima de Mulher, em 1879. Em 1881 publicou O Mulato, livro que escandalizou a sociedade com o seu retrato nu e cru da escravidão no Brasil, deixando transparecer o seu ideal abolicionista; mas sua principal obra foi O Cortiço, que também causou furor na sociedade de fins do século XIX.

O Cortiço já foi adaptado para o teatro diversas vezes e em 1978 para o cinema com Betty Faria, Armando Bógus, Mário Gomes e Beatriz Segall. Ainda não tive a oportunidade de assistir a este filme, mas tenho muito curiosidade em ver como o diretor adaptou esta intricada trama de Azevedo, se bem que o romance é repleto de sub-tramas, o que daria uma boa telenovela!


Filme de 1978


Um ótimo final de semana a todos e ótimas leituras!

Fernanda


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