segunda-feira, 23 de dezembro de 2019

"Encontro de Marés", Manuela Marques Tchoe

Olá, queridos leitores!

Hoje venho compartilhar com vocês a minha mais recente leitura. Trata-se de Encontro de Marés, da escritora brasileira Manuela Marques Tchoe. Manuela nasceu no Brasil, mas mora na Alemanha há muitos anos e escreve sobre relações entre culturas, tema que pervade, também, os seus contos na coletânea Ventos Nômades, publicada em 2018. Eu fiquei apaixonada pelo estilo de escrita de Manuela e fiquei muito feliz em ler o seu primeiro romance, publicado neste ano de 2019.

Eu simplesmente devorei Encontro de Marés, mas é preciso dizer que não é um livro fácil de ser lido, pois trata de temas difíceis de engolir, como a prostituição infantil, a violência nas favelas do Rio de Janeiro e Salvador, crimes contra mulheres e a corrupção da polícia. Porém, ignorá-los não significa que esses problemas não existam, e a escolha de Manuela de representá-los na literatura chama a atenção para a necessidade de combatê-los. Ler a narrativa de Rosa em primeira pessoa nos faz sentir no próprio coração as angústias e traumas de uma criança violentada e da mulher que ela se torna, e incita no leitor a vontade de tomar alguma atitude a respeito.

Contudo, Encontro de Marés não é apenas uma denúncia de problemas sociais brasileiros. O livro mostra através de um olhar brasileiro que vive longe de sua terra algumas delícias daqui, como a culinária, as belezas naturais, a cultura dos orixás, a fé em Iemanjá, a solidariedade e o aconchego do contato humano.

Iemanjá
A narrativa tem três fios condutores principais: Mariana, uma brasileira adotada por alemães quando criança que retorna ao Brasil a trabalho e acaba sentindo um desejo de saber mais sobre suas origens e resgatar o seu passado; Teresa, uma dona de casa de Ouro Preto, casada com Augusto e com dois filhos, que não suporta a ideia de ver a sua filha Janaína se mudar para a capital para seguir a sua própria vida; e a narrativa de Rosa em primeira pessoa, que se inicia em 1980. Rosa é uma menina de 12 anos que vive com a sua avó Dalva e que é obrigada a deixar o conforto da sua casa e o amor de sua avó quando é raptada por seu pai, Benedito, o cafetão-mor da Bahia, que vende sua própria filha para a prostituição.

São as histórias dessas três personagens que dão dinamismo ao romance, intercalado por capítulos que nos contam um pouco de cada uma e nos levam ao passado e ao presente em uma trama que se encaixa perfeitamente. Somente no final o leitor descobre como as vidas dessas três mulheres estão intrinsecamente ligadas e como o destino permitiu que elas finalmente se reencontrassem.

Além da trama envolvente e do estilo de escrita caprichado, que varia em oralidade e regionalismo de acordo com a personagem que se expressa, cada capítulo é intitulado a partir de uma canção brasileira, como "Insensatez", de Vinícius de Moraes e Tom Jobim, e "A Deusa dos Orixás", de Clara Nunes. Eu adorei essa escolha de Manuela que, além de dar uma brasilidade a mais para o texto, confere um ritmo e musicalidade à experiência de leitura. Que tal colocar "Garota de Ipanema" para tocar enquanto lê a chegada de Mariana ao Rio de Janeiro?

Manuela Tchoe

Manuela foi muito bem-sucedida neste primeiro romance e tenho certeza que estamos diante de um dos grandes nomes da literatura brasileira contemporânea.

Espero que tenham gostado dessa dica de leitura.

Uma ótima semana a todos e, é claro, ótimas leituras!

Fernanda





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